PRAIA DOS VIPS
A ladeira do sal liga a parte alta da cidade à Praia dos Vips. É por lá que se encaminha para a avenida litorânea, tendo-se uma vista de encantar a alma. Vê-se a grandiosidade do Oceano Atlântico e os recifes a cortar o mar paralelamente a costa, o que dá um toque especial a cena. No fim da ladeira, tomando-se a esquerda se passeia pela orla passando por residências, bares, hotéis e chega-se ao hoje abandonado Hotel dos Reis Magos, uma estrutura imponente num desenho que lembra uma bandeira balançado ao sabor do vento. Na sua frente há um parque aquático em estado de penúria com piscinas e amplo solário. Entretanto, num passado já não tão recente, aquele hotel era o melhor da cidade e lá recebia autoridades, cantores, atores e celebridades diversas. Esses Vips, como chamavam, saiam do hotel e caminhavam pela praia sendo reconhecidos por muita gente. Assim, surgiu o nome do local: Praia dos Vips. Muitas personagens das artes passearam por ali aproveitando os encantos do local. Boa parte dos artistas que se hospedavam no hotel, faziam shows na sua boite chamada de Royal Plaza. Toda a sociedade esperava ansiosamente por aqueles shows, que eram considerados inesquecíveis, devido à característica intimista do estabelecimento. Os artistas ficavam no palco a poucos metros da plateia, fazendo que houvesse uma interação fabulosa entre todos. Os que lá assistiram aos shows não param de lembrar e destacar a qualidade dos mesmos. Dali até surgiram amizades entre público e plateia. Numa dessas apresentações, uma dupla famosa em todo o país, confessou que compôs, numa das barracas da orla da praia, uma conhecida canção sob os auspícios de uma lua cheia. Conta-se que os artistas iam caminhar pela orla e chegavam a ladeira do sal. Era um tempo que não havia os perigos atuais nem a fetichização das celebridades que se vê hoje. Eles passavam quase que despercebidos e aproveitavam o passeio. Caminhavam pela orla, adentravam a Ponta do Morcego e chegavam ao seu final, onde as ondas batiam nas enormes pedras pretas e salpicavam uma água refrescante. Naquele pedaço de terra que avançava no mar havia muitos bares e restaurantes. Dali se tinha uma vista fantástica do mar e da cidade. Na esquina da Ponta do Morcego existia o Bar Katíspero, um dos locais mais frequentados pelos nativos e por aqueles que visitavam a nossa cidade. No fim da ladeira do sal se situava o chamado “quem me quer”, local frequentado por jovens que se reuniam para as paqueras. Ali se originavam namoros duradouros. Hoje, a Praia dos Vips não tem o mesmo encanto dos tempos de outrora. As edificações antes esplendorosas e bem cuidadas, atualmente estão deteriorando ao sabor do tempo. O elegante Hotel Reis Magos está praticamente em ruínas, só restando inteira, uma estátua de cor branca em homenagem aos seus patronos no interior do terreno, onde estão esculpidas as figuras dos homenageados. Para a surpresa de todos, de uma hora para outra, começou-se a falar na demolição do velho Hotel para dar lugar a um Shopping Center. Os defensores da sua derrubada defendiam a revitalização da área com um equipamento urbano de tal porte. No entanto, por outro lado surgiram os defensores da manutenção do Hotel, já que se tratava de uma arquitetura símbolo de uma determinada época. Os jornais e televisões passaram a mostrar fotografias do Hotel nos seu tempos áureos, com cenas de muitas pessoas usufruindo do parque aquático e, também, fotos de artistas passeando pelos seus arredores. Mas, com tudo isso, o Hotel continua lá. A sua fachada belíssima continua encantando a quem passa pela sua frente, apesar do estado avançado de deterioração. Os mais velhos recordam do Hotel Reis Magos como um marco da Cidade, os jovens se encantam com a sua beleza ímpar e outros defendem veementemente a sua derrubada. Eu continuo assistindo a todos os movimentos torcendo para que ele permaneça, embora, acho que as linhas arquitetônicas poderiam ser mantidas em qualquer uma das soluções que viesse a ser feita. Alguns sonhadores falam que os Reis Magos ali representados na estátua, protegem a edificação e expulsam os invasores e os destruidores daquele bela obra. Soma-se a essa missão, os fantasmas das naus de muitas nacionalidades que afundaram no Poço do Dentão, situado no mar em frente ao hotel, e, ali firmaram suas energias. Também, fala-se dos artistas que passeiam por ali em plena juventude e marcam sua presença num território de energias oníricas afloradas num lugar tão especial. Todas essas forças, certamente, vão manter o Hotel em pé, e, ele será para sempre o símbolo de um tempo que não existe mais.