O DIA DOS CHATOS
O tradicional Café São Ruiz promoveu um concurso do cidadão mais chato da cidade. O Edital do Concurso foi pregado no quadro de avisos do estabelecimento, e as regras eram as seguintes: a primeira versava sobre a inscrição que poderia ser feita pelo próprio candidato ou por alguém que o inscrevesse, a segunda seria que no dia do certame os casos de chatice iriam ser contados por quem se inscrevesse ou por quem o inscreveu, terceira, o vencedor seria o mais votado pela audiência que comparecesse ao evento, quarta, o prêmio seria a publicação da estória contada nos principais jornais da província, com fotos dos vencedores e, medalhas de ouro, prata e bronze para os primeiros colocados. Esse episódio aconteceu nos anos setenta, mas marcou época e abriu espaço para mais algumas edições do concurso. Ressalta-se, que o título de mais chato foi motivo de orgulho para os participantes e vencedores. Após a divulgação dos Editais, a imprensa local tratou de divulgar o concurso. Em poucos dias não se falava em outra coisa na cidade. A primeira inscrição veio do ufólogo OVNI, um chato que insistia na existência de civilizações alienígenas que visitavam constantemente o nosso planeta, inclusive, espalhava o boato de que muita gente da cidade era extraterrestre. Os principais eram aqueles que apresentavam alguma excentricidade no vestir, no falar e na aparência. A segunda inscrição foi a do amigo de todos Alvarenga, como ele se definia, pois, tinha o hábito de se meter na vida das pessoas, dando pitacos na vida íntima, na compra de bens, nas roupas, na bebida, no sabor das comidas, e tudo mais que pudesse receber alguma opinião. Outro candidato foi o terrível Argemiro, como era conhecido, um cara que quando bebia, grudava numa pessoa e não largava, houve situações de fugas desesperadas. Outro forte candidato foi o jornalista Saraiva, que tinha uma famosa coluna num jornal local, recordista de leitores, sendo praticamente lida por toda a cidade. Nela o famoso jornalista descavava a vida de muita gente, contando situações particulares de moradores, divulgando notícias de traições, falências, brigas, fofocas, etc. Outro inscrito foi o candidato Geraldinho que tinha o hábito de chamar as pessoas por apelido que ele inventava de acordo com a características físicas destas. Ele chamava um conhecido desembargador da cidade de Dr. Coelho, embora o seu sobrenome fosse Silva, talvez em função das grandes orelhas do jurista. Também, chamava de Mosquito um Senhor da cidade muito magro e de Anão de Jardim outro morador muito alto. E o pior é que muitos desses apelidos pegavam e era difícil de largar a nova alcunha. Um outro chato conhecido que se inscreveu foi o Dr. Peninha, que não era médico, mas passava tratamento para curar a doença que ele achava que as pessoas tinham. O povo fugia desse chato. Havia outro cidadão que foi inscrito por um terceiro chamado Seu Menelau, que vendia de tudo, desde relógios a perfumes, e não largava do possível comprador até que esse comprasse alguma coisa. Também, houve vinte e três inscrições feitas por terceiros para que o poeta Valentim participasse do concurso. Essa figura abordava as pessoas perguntando o que elas estavam lendo atualmente, depois passava a fazer uma resenha das suas leituras, alugando o interlocutor por horas, fazendo dele um chato conhecido. No dia do concurso a cidade parou. Para dar conhecimento ao público do que estava acontecendo, todo dia era colocado no mural do café São Ruiz a lista dos inscritos. No dia do Concurso a rua do Café São Ruiz ficou lotada de gente. Havia muitas torcidas organizadas com cartazes e faixas com os nomes dos candidatos e frases elogiosas aos seus chatos de preferência. Como exemplo, lembro da frase em favor do jornalista Saraiva: As verdades são chatas, vote em Saraiva. Para a apresentação das chatices dos candidatos foi montado um palco. As estórias seriam apresentadas tanto pelos próprios chatos como por terceiros. Depois de muita chatice contada pelos participantes ao som de palmas e vaias, foi anunciado o vencedor do certame. O primeiro prêmio foi para o Jornalista Saraiva, seguido por OVNI e Alvarenga. Os candidatos subiram ao palco para buscar suas medalhas. Nos dias seguintes, a imprensa local anunciou os vencedores do concurso e suas respectivas estórias. As estórias e as fotos dos vencedores foram publicadas nos principais Jornais e esse foi o assunto preferido da população por muito tempo e ficou conhecido como o Dia dos Chatos.